A rodar XLI

Durante a minha juventude e apesar de andar de Doc Martens, jeans apertados e shirt's rasgados ... sò tive dois idolos musicais que foram o Bruce Springsteen e o Tom Waits. O primeiro forjou as minhas convições socio-politicas e o segundo a minha maneira de viver, de existir. No inicio dos anos 80 era dificil encontrar os discos de ambos em Portugal, então o meu tio que ia regularmente aos EUA/Canada trazia-mos e fazem parte de uns quantos dos quais nunca me separei. Ambos são Punk's sém o rotulo e de uma maneira oposta pois o "Boss" erigiu a energia revoltada e a critica social no centro da sua obra enquanto o Tom Waits pelo abuso de Wiskey e pelas depravações mostrou uma face escondida da américa puritana, hipocrita e wasp. Simbolo absoluto do Dandysmo "à la Waits", dos excessos e da irreverência social, o Small Changes é uma ode épica aos marginais e aos senhores da noite. Esta musica brumosa, enevoada pela omnipresença do fumo do tabaco é uma viagem aos confins da noite. A atmosfera desta obra singular tém o aroma das segregações carnais que se misturam aos vapores da embriaguez e representa o paroxismo do estilo que foi chamado de "alcohol music". Uma viagem decadente e mistica até ao lado obscuro que tanto nos tenta e que me recorda grandes noitadas là para os lados de cacilhas ou do cais de sodré  

O Small Change no singular e não no plural (mea culpa...) foi também o meu primeiro Tom Waits e dai que tenha uma relação especial com esse album, o melhor dos anos "Asylum" nmho. Mas apesar da sua grandeza decadente, e como explico regularmente a alguns amigos ou adeptos do rapaz, a sua maior obra até hoje é o Rain Dogs. Um facto pouco lido e falado é a capa, aonde a serigrafia copia ou sugere o da escrita do London Calling mas no ângulo oposto, adicionado à foto em branco e preto que transmete uma ternura estranha mas em oposição à violência do Paul Simonon partindo a guitarra no album dos Clash. Dois anos atràs em 1983 o "Tom" tinha saido uma obra prima que era o primeiro album para a editora Island (Swordfishtrombones). Se o estilo musical continua de aparência "destructurado", na realidade o rapaz afastou-se do bar nocturno bluesy afim de se aproximar do clima sufocante e humido do jazz da Nova Orleães. Em se aproximando de uma musica quase primitiva, espontanea, visceral e primal ... o Tom Waits volta à arte dos excluidos e dos marginais. È a mesma mensagem de sempre, mas dita de uma maneira diferente e aqui a é a classe "Dandy" que domina a construção. O espectro do Ayler sobrevoa esta obra tão complexa quanto dificil mas finalmente essencial. O nosso "bêbado sublime" roça durante o espaço deste album os dedos de Deus e assena uma verdade muitas vezes esquecida ... que é que a musica e o ser humano não se conjugam no plural!!!...

Do primeiro album em 1973 até ao Tunnel of Love em 87 não hà nada a deitar fora do homém e temos mesmo uma bela e rarissima espetada de obras primas diferentes. È verdade também que o Springsteen continua a ser um showman unico que apesar da idade continua a partilhar muita energia ao vivo, sempre com um sentido socio-politico aguçado. No entanto seria injusto de pensar que a sua discografia apòs o album atràs citado é mà ou sém interesse pois dois albuns pelo menos são monumentos, ainda pouco venerados e badalados pela critica. O sombrio e desesperado The Ghost of Tom Joad encontra o clima àspero e desnudado do crepuscular Nebraska mas é o The Rising (O erguer/O levantar) que prova que as convições do homém continuam intactas. Esta obra feita como uma resposta aos atentados do 11 Setembro é um disco federador para todos os americanos mas que ecoa no coração de qualquer ser humano. As diferentes canções e temas abordados falam da necessidade de viver juntos, do respeito, da dignidade de cada um e do amor universal. Impregnado de uma sinceridade rara nas altas esferasl do Rock o The Rising prova que o tempo passou ... mas que o Bruce Springsteen continua a ser o "Patrão" !!!...